Flá @ 02:59

Sex, 15/10/10

Ao acordar lembrei-me de te voltar a escrever. Senti saudades de te escrever. De te descrever. Senti falta de assinar com amor da para sempre tua Flávia. Senti falta de desdobrar entusiasmada as tuas cartas (carregadas de cheiro a ti). De forçar a vista para desencriptar a tua letra sempre pequena. Senti falta de não sentir falta.


Depois enraivecida pela falta de não sentir falta apeteceu-me partir qualquer coisa. Enraivecida pela vontade nunca alcançada de nunca mais sentir falta do que fomos no inicio apeteceu-me partir tudo. Apeteceu-me partir-nos.


Apercebi-me hoje, na fúria matinal, que me tens na mão. Tanto como tenho na minha o que és. E hoje quero partir esse laço. Esse poder que temos sobre nós como pessoa dupla que dorme em cama de solteiro, como se fossemos um só.


O melhor é seguires o que resta do teu caminho. Do teu caminho sem mim. É este o conselho último que tenho para te dar. Usa os teus últimos passos para fugires do que te consome. Do que te exige que continues um ser humano sem evolução. Estático. Amorfo.


Por favor, meu Amor (meu eterno Amor), gasta o teu último travo para nos despedaçares. Quebra impreterivelmente aquele tom carinhoso com me falas à noite, ao deitar. Faz-nos irremediavelmente inconcertados. Esconde esse teu colo que nos cola sempre que em ataques de pânico nos parto. Quanto mais tempo gastares a limpar as lágrimas e a tentar fechar na mão o que sou, mais haverá para despedaçar. Tens de crescer. Não podes chorar mais. Pára! Tens de ser implacável. Faz de mim um pedaço de nada. Rápido! Ou haverá mais de nós para partir. Desfaz-me a nada. Rápido…


Sinto que as saudades inconsoláveis do que fomos não me deixam ficar totalmente encantada com a maturidade adorável que alcançámos. Com os desenhos precisos que fizemos para o nosso futuro. Não aguento esperar. Sinto que a espera me sufoca a cada olhar cúmplice que trocamos. São traços tão firmes e extasiantes que não consigo sentir-me ao nível do que projectamos. Não me consigo sentir capaz de suportar a espera que temos pela frente. Nem consigo largar a imagem do que fomos e  que inconsolavelmente não mais voltaremos a ser. Então se não pode ser o futuro nem o passado e se nem merecedora sou do presente  só mereço que nos partas. Por favor, parte-nos.


Faz de mim um estilhaço inconcertado. Quebra-nos irremediavelmente de uma perfeição na qual nunca consegui tocar (nem em biquinhos dos pés). Rápido! Ou haverá sempre mais de nós para despedaçar. Desfaz o laço lindo, perfeito e viciante que criámos.



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