Deixa-me ajudar-te a tirar essa camisa-grilhão que me impede de chegar mais perto de ti. Que me impede de conhecer o teu cheiro, a tua pele. O teu arrepio.
Deixa-me sussurrar-te o que me vai na cabeça e me estremece o corpo.
Consigo sentir a dormência de todo o teu corpo na tua voz sumida. Ofegante. Mostra-me que o teu olhar também tem mácula e tira por umas horas esse ar sempre doce. Sempre demasiado doce. Larga pela sala toda a emocionalidade das relações e deixa também por ai as moralidades. Voltadas para baixo para que eu não as veja. E não me pesem.
Depois compomo-las.
Murmura-me, por favor, sem subtilezas, tudo o que achas de mim. Achas-me detestável? Óptimo. Que fazes de mim assim, despida e, detestavelmente, apetecível?
Vamos acabar com isto de uma vez!
Chega-te cá. Bem pertinho. Chega cá esse ouvido ao pé de mim. Esse pescoço. Chega-te cá. Com todo o teu corpo disponível para me ouvir.
Não sei se já te confidenciei mas é ao acordar que mais falta me faz a tua presença. Física. Enquanto a voz ainda arranha a garganta e não está para grandes conversas. Preciso que me ajudes a acordar.
Acorda-me. Desperta-me para o dia que ai vem. Desperta o pior que há em mim. Desperta-me o corpo. Atiça-me a mente. Espicaça toda a minha criatividade. Desperta-me de modo a que vinte terços não me concedam redenção.
Provoca-me a perder a subtileza nas palavras. Provoca-me com meigas indecências ao que quiseres. Ao que te apetecer. Mas aproveita agora! Fá-lo agora…
(Ou fica ai a dormir para sempre!)
Não suporto amar-te e não te poder querer, detesto querer querer-te e sentir que não queres que te queira.
Detesto tudo o que me deste.
Detesto ter sido tão feliz contigo, detesto a saudade.
Detesto querer morrer.
Detesto o que me tornei.
Detesto querer procurar-te noutro, detesto não te encontrar nele.
Detesto detestar, enquanto detesto não te detestar.
Antes tinha pena das pessoas que não sabiam o que era amar, hoje tenho pena de mim.
Só te amo.
P.s. Escrevi isto noutra era (mesmo), mas achei piada encontrar isto rabiscado nuns apontamentos antigos. Data de 29 de Setembro de 2008.
Apercebi-me ao fim de um magro par de anos que o que me cativou no teu olhar se esfumou como a magia do Natal. Do Natal com o jantar que por rotina junta toda a família, que por rotina termina com discussões e amuos.
Não sei se são ciclos intermináveis de acontecimentos repetidos ou simples rotinas rotineiras. Acordar. Banho. Sair a correr com a sensação de que algo ficou esquecido. Talvez o iPod. Um maço de lenços. O tão preciso relógio. Ou o viciante telemóvel. Um acessório? Um adorno? Um mimo para ti? Não importa. Sigo o dia mesmo depois de saber o que ficou esquecido. Quase que já não faz falta pelo simples hábito que já criei de não sentir falta do que vai ficando esquecido diariamente. E que um dia vai ficar perdido. Irremediavelmente irrecuperável.
Passámos, sem uma vida a acompanharmo-nos de mão dada, a barreira do gostar por amor e com paixão para um gostar com amor de amizade. Para uma rotina de beijinhos na boca com hora quase marcada. Com beijinhos que diariamente acontecem entre as mesmas tarefas rotineiras.
Apagou-se. Como a lareira que crepita e nos dá conforto e calor. Mas que um dia se apaga para só se voltar a acender na próxima estação fria. Deixa de fazer sentido, naquele momento, voltar a compô-la.
18 de Março de 2011
Bonjour à tous bienvenue
Je suis de retour
Ao acordar lembrei-me de te voltar a escrever. Senti saudades de te escrever. De te descrever. Senti falta de assinar com amor da para sempre tua Flávia. Senti falta de desdobrar entusiasmada as tuas cartas (carregadas de cheiro a ti). De forçar a vista para desencriptar a tua letra sempre pequena. Senti falta de não sentir falta.
Depois enraivecida pela falta de não sentir falta apeteceu-me partir qualquer coisa. Enraivecida pela vontade nunca alcançada de nunca mais sentir falta do que fomos no inicio apeteceu-me partir tudo. Apeteceu-me partir-nos.
Apercebi-me hoje, na fúria matinal, que me tens na mão. Tanto como tenho na minha o que és. E hoje quero partir esse laço. Esse poder que temos sobre nós como pessoa dupla que dorme em cama de solteiro, como se fossemos um só.
O melhor é seguires o que resta do teu caminho. Do teu caminho sem mim. É este o conselho último que tenho para te dar. Usa os teus últimos passos para fugires do que te consome. Do que te exige que continues um ser humano sem evolução. Estático. Amorfo.
Por favor, meu Amor (meu eterno Amor), gasta o teu último travo para nos despedaçares. Quebra impreterivelmente aquele tom carinhoso com me falas à noite, ao deitar. Faz-nos irremediavelmente inconcertados. Esconde esse teu colo que nos cola sempre que em ataques de pânico nos parto. Quanto mais tempo gastares a limpar as lágrimas e a tentar fechar na mão o que sou, mais haverá para despedaçar. Tens de crescer. Não podes chorar mais. Pára! Tens de ser implacável. Faz de mim um pedaço de nada. Rápido! Ou haverá mais de nós para partir. Desfaz-me a nada. Rápido…
Sinto que as saudades inconsoláveis do que fomos não me deixam ficar totalmente encantada com a maturidade adorável que alcançámos. Com os desenhos precisos que fizemos para o nosso futuro. Não aguento esperar. Sinto que a espera me sufoca a cada olhar cúmplice que trocamos. São traços tão firmes e extasiantes que não consigo sentir-me ao nível do que projectamos. Não me consigo sentir capaz de suportar a espera que temos pela frente. Nem consigo largar a imagem do que fomos e que inconsolavelmente não mais voltaremos a ser. Então se não pode ser o futuro nem o passado e se nem merecedora sou do presente só mereço que nos partas. Por favor, parte-nos.
Faz de mim um estilhaço inconcertado. Quebra-nos irremediavelmente de uma perfeição na qual nunca consegui tocar (nem em biquinhos dos pés). Rápido! Ou haverá sempre mais de nós para despedaçar. Desfaz o laço lindo, perfeito e viciante que criámos.
Já me aconteceu acordar feliz. Certa manhã acordei feliz. Tão feliz. Só sabia o que era ser feliz. Apenas conhecia o sentimento puro e esmagador da felicidade. Havia felicidade a entrar em cada um dos poros que me constituem. Eu era feliz. Só era feliz. Feliz e pronto, nada mais, apenas feliz.
Nessa manhã fui atirada para tudo como uma vencedora. Cumpria com êxito reconhecido tudo quanto me propunha. Tudo era ou ficava perfeito. Eu não só era capaz como forte e ainda radiante. E sempre feliz.
Estava envolvida em tudo quanto sempre havia sonhado. A medida e a forma de tudo o que me envolvia eram perfeitos. Eu própria estava muito próxima de atingir a perfeição. Lá andava eu em bicos dos pezinhos em cima de uma nuvem a tratar de tudo. Tratava de tudo sem restrições ou grilhões, fazia-o com afinco e gosto. Era como uma abelhinha atarefada. Nessa manhã tudo era fácil, leve…natural.
A felicidade com que havia acordado naquele dia era constante e voltava todas as manhãs, dando-me alento para todas as tarefas de todos os meus dias. Tudo o que me era possível fazer eu fazia-o e isso deixava-me feliz. Ainda mais feliz.
Mas… de repente, antes de dormir, os meus pulmões esqueceram-se de como respirar. Pararam, simplesmente, de respirar. Assustado o meu pequeno coração bateu descontrolado tentando cumprir também com a tarefa dos pulmões e quase me matou. E eu, pobre tola, rebolei e quase sufoquei em cima da cama com o pijama já vestido. Impetuoso lá entraste a gritar…abraçaste-me e não paraste de gritar comigo. Gritavas para me voltar a ensinar a respirar calmamente e sem sobressaltos.
Tenho, desde então, acordado assustada. Desanimada. Tenho acordado sem forças e cansada. Sem ideias. Sem causas ou sonhos.
Tu apareces todos os dias, sorrindo, como um Anjo da Guarda. Levantas-me da cama. Empurras-me para o banho. Ensinas-me a voltar a respirar. Abraças-me sempre que acordo a meio da noite com medo e a chorar.
Devolves-me, todos os dias, a vida. A segurança. Devolves-me todos os dias algum brilho. E impinges-me a felicidade em cada abraço em que me apertas.
Obrigada, meu Anjo, sem ti não seria capaz.
P.S. Só te amo.
Sabia que: um ataque de pânico (coração acelerar e bater mais forte sem esforço físico, como por ex. correr) pode envelhecer o seu coração até 2 anos? Respire calmamente, pense em coisas boas e calmas. Relembre a infância. Seja feliz. Viva pelo menos mais 2 anos.
Quem mais que tu me faz rir, rebolar e espernear ao mesmo tempo? Só tu me atacas as secretas cócegas que apenas tenho no pescoço e nem sempre. Só tu reparas na forma como desenho a letra f. Só tu vais a correr ver o meu blogue sempre que o actualizo.
Que outros olhos reparariam em mim? Nos meus cabelos. Nos meus olhos. Nas minhas sardas. Nas minhas mãos pequenas. Que outros olhos seriam capazes de reparar em mim? Só os teus olhos vêem os meus cabelos caramelo, como só tu lhes chamas. Ou os meus olhos verdes. Só eles conseguiram, no primeiro encontro, reparar nas sapatilhas de criança com flores que eu calçava. Só tu o dirias alto. Apontando e rindo. Para além de ti não há ninguém, ninguém, capaz de me ature atentamente o bracejar constante que não largo enquanto falo. Enquanto, chatarrona, não me calo.
Foi contigo que aprendi a reconhecer o som do baixo em todas as músicas. Foste tu, o único, a ver comigo todos os filmes que me fazem chorar. Foste tu quem foi descobrir mais e mais filmes de fazer chorar. És tu quem me afaga o cabelo. Quem me abraça enquanto ranhosa e envergonhada tento esconder no teu abraço as lágrimas e os olhos vermelhos.
Quem mais que tu me perguntaria com genuína preocupação como consigo eu respirar com um nariz tão pequeno? Mais ninguém para além de ti, dos teus olhos, dos teus braços faz tanto pela minha felicidade. Por uma lágrima. Por um sorriso. Por mim.
Quem mais que tu me faz feliz?
Ninguém!
Parabéns =)
P.s. Obrigada por me fazeres sentir tão especial e, realmente, importante.
E do nada é já noite às 6h da tarde. Do nada o vestido preto com a camisa deixa de fazer sentido ou, sequer, parecer bem sem o sobretudo.
Apresso-me…os sapatinhos de tamanho 33 tocam leve e rapidamente a calçada intermitente. É tardíssimo. Saltam pequeninos para o degrau do autocarro. Credo…os passos apressados e saltitantes fizeram com que a cafeína bebida tivesse outro efeito que não o de manter a mente mais desperta e atenta. Só quero vomitar. Preciso de aliviar o estômago que nervoso, palpitante e enjoado não me deixa concentrar nos olhos pesados ou nas conversas tontas, soltas e aleatórias que poderia ouvir.
A música pede por favor. Pede silêncio. Pede a ausência de surpresas. Pede que não haja mais alarmes. Mas os galhos das oliveiras e das nogueiras saltaram as sebes e esmurram o autocarro a cada curva. Não me é possível dar descanso à mente que me instiga a dormir. Não consigo…o caminho é demasiado irregular. Turbulento de mais para poder pensar no que quer que seja para além das oliveiras ou das nogueiras a esmurrarem o autocarro num som que primeiro é estrondoso e depois áspero e estridente. Mais as curvas, as lombas, as paragens, os buracos…há demasiada agitação. Não é possível o silêncio, a ausência de surpresas ou de alarmes como a música que se ouve ao fundo pede.
E do nada já passou um ano…